sábado, 10 de abril de 2010


" Na embriaguez do haxixe nada há que se pareça. Não sairemos do sonho natural. A embriaguez será, em toda a sua duração, um imenso sonho, graças à intensidade das cores e à rapidez das concepções; mas conservará sempre a tonalidade individual do indivíduo. O homem quis sonhar,o sonho governará o homem; mas esse sonho será filho de seu pai. O ocioso procurou introduzir artificialmente o sobrenatural na sua vida e no seu pensamento; mas, apesar de tudo, e não obstante a energia acidental das suas sensações, é apenas o mesmo homem aumentado, o mesmo número elevado a uma altíssima potência. É subjugado; mas, por sua infelicidade é subjugado por si mesmo; quis ser anjo, tornou-se animal, momentaneamente poderosíssimo, se é que se pode chamar poderosa a uma sensibilidade excessiva, sem governo que a modere ou aproveite.
(...)
- Eis portanto, a felicidade! Enche uma pequena colher! A felicidade, com todas as ebriedades, todas as loucuras, todas as infantilidades! Podeis engolir sem receio; não se morre disso. Os vossos orgãos físicos não sofrerão qualquer dano. Mais tarde, talvez, um por demais frequente apelo ao sortilégio, diminuirá a força da vossa vontade, talvez sejais menos homem do que o sois hoje; mas o castigo vem tão longe, e o desastre futuro é de natureza tão difícil de definir! Que arriscais? Amanhã, um pouco de fadiga nervosa. Não arriscais todos os dias maiores castigos por recompensas mais pequenas?
(...)
O vapor silvou, o velame está orientado, e vós tendes sobre os viajantes vulgares o curioso privilégio de ignorardes aonde ides.
Assim o quisestes, viva a fatalidade! "


' Os Paraísos Artificiais ',
Charles Baudelaire

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